9 de abr. de 2025
As verdades sobre ser mulher, designer e empreendedora
Um trecho do livro "Crie. Reinvente. Empreenda", de Andressa Siegel
Franklin Roosevelt disse: "a única coisa que devemos temer é o medo. É o verdadeiro inimigo da liberdade". Ninguém se sente um sucesso todos os dias. E se você está começando um negócio do zero, vai sentir tudo, menos que já alcançou o sucesso. Pode ser que os resultados demorem para surgir ou que você tenha períodos sem retornos financeiros, e isto faz parte do processo.
Empreender é sobre liberdade. Mas nem sempre é fácil enxergar o que está nos impedindo de chegar lá.
A verdade sobre empreender
Eu não vou mentir: trabalhar para si não é fácil. E eu falo com todos os privilégios envolvidos. Quero passar uma visão realista. Se você tem vontade de se arriscar, mas tem dúvida ou medo, se questione do que se arrependeria daqui a dez anos: de ter tentado algo novo ou de ter ficado na sua zona de conforto, pensando no que poderia ter feito de diferente?
Muitas de nós passamos por uma educação na qual a segurança era o objetivo principal, sendo incentivadas a seguir caminhos tradicionais e previsíveis, como uma forma de garantir estabilidade. Essa ênfase na segurança, muitas vezes, nos levou a evitar riscos e inovações, deixando de lado nossos verdadeiros sonhos e paixões em prol de uma aparente tranquilidade.
Na minha infância, lembro como os meninos viviam ralados, com braços engessados, usando aquele reforço de couro no joelho do uniforme, enquanto as meninas eram inclinadas a fugir da chuva, fugir do perigo, "não suba muito alto", "cuidado com a rua", "olha a postura". Sempre houve aquela pressão interna e externa em sermos perfeitas, tirar 10 em tudo, agradar os pais, os professores. Aprendemos a tomar cuidado e não se machucar, não sujar a roupa, não ficar doente, sentar do jeito certo, enquanto os meninos aprendem a explorar, a ir mais alto, e que se pode remendar o uniforme quantas vezes forem necessárias.
Ninguém percebe o quanto isso nos impediu de correr riscos e ir atrás dos nossos próprios sonhos. Eu mentorei centenas de mulheres das mais variadas profissões, regiões e idades, mas a maioria compartilhava o mesmo pavor de fracassar. Nós queremos ser perfeitas antes mesmo de começar.
A ambição feminina existe, porém vive em uma espécie de purgatório. Parece existir uma curva em que as pessoas aplaudem suas conquistas até você atingir um certo limite; a partir daí, suas realizações são acompanhadas pelo coro cruel de que "ela nem merece" ou "ela nem é tão boa assim". Essa corrida pela descredibilização das conquistas femininas é, sem dúvida, um sintoma da sociedade patriarcal.
Segundo o relatório Gender Insights Report, do LinkedIn, os homens se candidatam a vagas mesmo que atendam 60% dos requisitos, enquanto mulheres só se candidatam se cumprirem 100%. É o que aconteceu a uma colega. Quando surgiu vaga para a empresa que ela tanto queria trabalhar e foi chamada para entrevista, me falou: "Será que erraram na triagem?". É realmente muito triste.
Quantas ideias você deixou de lado por medo de não dar certo?
O pior da falta de confiança é que você passa a terceirizar sua vida. Eu conheço pessoas com mais de 30 anos que antes de tomar qualquer decisão perguntam a opinião da mãe, do marido, das amigas, para então agir. Muitas vezes pedimos opiniões porque não queremos que aquela decisão seja julgada no futuro.
Se você procrastina a tomada de decisão, ela se torna uma mentira de que contamos para nós mesmas. "Depois eu tento", "ano que vem", "agora não é o momento", e o depois nunca chega e ficamos ressentidas com a vida.
Será que você procrastina porque está com medo de não entregar a tarefa tão bem quanto o seu perfeccionismo cobra?
Só passamos a tomar as rédeas de nossas vidas quando algo drástico acontece, como aconteceu comigo com a demissão. Se você tende a pensar no pior, use isso a seu favor. Liste tudo o que pode acontecer de ruim e como você vai contornar a situação - se ela de fato acontecer.
Uma cliente certa vez me disse: "o pior que pode acontecer é eu morrer de fome". Perguntei: "certo, mas e se você não tentar?". Ela pensou um tempo e riu: "vou morrer de fome do mesmo jeito". A boa notícia é que ela tomou coragem em pedir demissão e, logo no primeiro mês, fechou a agenda com clientes. O que parece seguro não é tão seguro assim. Como costuma ser atribuído a Albert Einstein, “loucura é querer resultados diferentes fazendo tudo exatamente igual".
Ouça, sim, as vozes na sua cabeça que mostram o que pode dar errado, mas entenda que 99% das vezes não acontece da forma como imaginamos. No lugar de imaginar os piores cenários, que tal imaginar: "e se?". E se tudo der certo? E se eu fechar os primeiros clientes? E se eu chegar no mesmo patamar salarial trabalhando pra mim mesma? E se eu me tornar autoridade no assunto?
Empreender é libertador
Quando falo sobre liberdade não é apenas sobre tempo e geográfica. Você criar seu próprio negócio é um exercício de se libertar do que os outros pensam, do perfeccionismo, da monotonia, da impotência, do sentimento de escassez, do medo do desconhecido, da necessidade de certezas, da comparação, da exaustão como símbolo de produtividade, da ansiedade, de querer estar sempre no controle.
Comece a prestar atenção em que momentos você mesma bloqueia seu potencial. Quando você se empolga falando sobre o assunto, sente muita expectativa, só que por algum motivo você engaveta essa ideia. “Não é o momento. É uma ideia meio doida. O que vão pensar sobre mim?”. Passam os anos e aquela ideia continua voltando na sua mente de tempos em tempos, mas você continua a ignorar.
Se não agora, então quando? Quem trabalha com o universo da criatividade, artístico, já sofre uma pressão externa, seja de familiares ou amigos, que questionam “quando você vai encontrar um trabalho de verdade?”. Se você até hoje não consegue fazer com que as pessoas entendam o que você faz no trabalho, imagina você chegar para familiares e explicar que a partir de amanhã você trabalha para você mesma.
“Vai passar fome”, “vai dormir o dia inteiro”.
Pode ser que ninguém te leve a sério. Pode ser que você sinta que as pessoas ao seu redor te subestimam. Pois use isso como combustível para seu sucesso.
Eu entendo como mulher, designer, jovem. Mesmo com todas as comprovações de resultados, parece que a todo momento você precisa se reafirmar. E se, além de tudo isso, você vem de condição socioeconômica desfavorecida, a jornada é ainda mais desafiadora.
Será que deveríamos levar tão a sério críticas daqueles para quem não pediremos conselhos?
Síndrome da impostora
Como boa pesquisadora, quando decidi trabalhar com o público feminino, eu fui atrás para entender quais são as emoções que nos travam. Foi inevitável eu cair em algo que talvez você está cansada de ouvir, mas também cansada de sentir: a tal síndrome da impostora.
Eu comecei a perceber cinco padrões, especialmente presentes nas mulheres, inclusive nas que atuam como designers:
A perfeccionista: sente-se como uma impostora porque sua necessidade de controle e perfeição a faz acreditar que não é tão inteligente, capaz ou amável quanto os outros pensam. Ela nunca sente que o trabalho está perfeito; sempre acha que poderia ter feito melhor. Para a designer, isso se manifesta na eterna insatisfação com seus projetos, sentindo que nunca são bons o suficiente;
A especialista: vive com a sensação de ser uma farsa porque não sabe absolutamente tudo sobre determinados tópicos. Apesar de estar sempre estudando e buscando mais conhecimento, nunca se sente verdadeiramente uma especialista, o que alimenta sua insegurança ao emitir opiniões. No universo do Design, essa dúvida aparece quando você sente que não domina todas as ferramentas ou as mais novas tendências;
A gênia: acredita ser uma fraude porque não se vê como naturalmente inteligente ou competente como deveria. Ela não se permite ser iniciante e sente também que é uma impostora sempre que enfrenta dificuldades no processo de aprendizado. Como designer, ela acha que deveria saber tudo de primeira, sem passar pelas etapas normais de aprendizado e evolução;
A solitária: acredita que deveria ser capaz de resolver todos os problemas por conta própria e se sente inferior quando precisa pedir ajuda. Para ela, cada pedido de apoio é uma confirmação de sua inadequação. No design, isso aparece quando ela reluta em colaborar ou pedir feedback, acreditando que isso a torna menos capaz;
A supermulher: acredita que deve ser a última a sair do escritório, a mãe que dá conselhos para outras, a que coleciona prêmios e equilibra um corpo perfeito com uma rotina atribulada. Na vida de uma designer, essa sensação se reflete na busca constante por fazer mais e melhor, enquanto tenta equilibrar todas as áreas da vida, sem nunca admitir que precisa de uma pausa.
Sentimos que precisamos entregar o dobro do trabalho e assumir o triplo das responsabilidades para, quem sabe, algum dia nos sentirmos minimamente dignas de reconhecimento.
Eu não posso ignorar que a síndrome existe. É ignorar algo que o mercado de trabalho está profundamente contaminado e perpetuar mais uma forma de violência contra as mulheres.
A síndrome pesa mais quando você olha para o lado e não percebe tantas referências para se inspirar. Quantas vezes eu fui na cara e na coragem em eventos de empreendedorismo com medo de ser minoria. Mas então você encontra outras mulheres e troca acenos com aquela compaixão silenciosa de "estou aqui também, está tudo bem".
Se não há referências, torne-se você a referência. Empreender abre a possibilidade de amplificar a voz de minorias, pensar e fazer diferente. Similares atraem similares. Quanto mais você compartilha posicionamentos, mais atrai clientes que a veem como um exemplo e isso reverbera em uma série de resultados.
O primeiro passo para vencer o medo é dar nomes aos bois. O medo é uma reação natural ao sair da zona de conforto. Nosso cérebro é programado para tomar decisões seguras e conhecidas, porque ele sempre vai buscar previsibilidade. Como designer, você provavelmente já enfrentou desafios criativos e técnicos e superou muitos deles. A mesma resiliência pode ser aplicada ao empreender.
Aprendendo com os erros
Conversei com várias mulheres sobre os medos que surgem ao pensar em autopromoção nas redes sociais para divulgar seus produtos ou serviços. Surgiram os mais variados medos. E aqui vem um ponto importante: como empreendedora, você precisa falar sobre seu trabalho, mostrar seus méritos, seus resultados e o quanto o seu conhecimento impacta vidas. Não é esnobe reconhecer o valor do que você faz.
No entanto, para muitas mulheres, essa exposição nem sempre é fácil, porque pode parecer arrogante, sem humildade, ou como se você tivesse o ego inflado. Mas me pergunto: será que as pessoas dizem o mesmo sobre homens que empreendem? Quando um homem fala sobre seus resultados e conquistas, raramente isso é visto como algo negativo. Pelo contrário, muitas vezes é interpretado como confiança e assertividade. Então, por que nós, mulheres, sentimos que estamos exagerando quando fazemos o mesmo?
Os principais medos que as mulheres citaram como travas foram:
Do conteúdo "flopar": você investir tempo em construir um conteúdo, mas ele não ter o engajamento esperado;
De falar "errado": errar a pronúncia de uma palavra ou explicar algo incorretamente;
De ser mal interpretada: falar A e as pessoas entenderem B. Parece que remediar uma situação é muito mais complexo no digital;
De julgamento: seja você consigo mesma ou pessoas próximas como familiares, amigos, colegas de trabalho. Ser chamada de “blogueirinha”, por exemplo, mas de forma pejorativa;
De fazer "errado”: ter dificuldades com as ferramentas da rede social;
De ficar com vergonha: tendo reações físicas como vermelhidão ou tremedeira em frente às câmeras;
De não ter apoio: que talvez seja um dos mais complexos porque é muito fácil desistir;
E por fim, mas não menos crítico, o medo de se autopromover, de soar como uma farsa.
Reconhecer e enfrentar os medos da exposição online é essencial para aproveitar ao máximo essas plataformas. Por isso, faça a seguinte atividade: Escreva cada medo citado acima e, ao lado, coloque um número de 0 a 10, sendo 0 um medo que é indiferente para você e 10 um medo real que te impede de sair do lugar.
Quando eu senti os primeiros frios na barriga ao pensar em empreender, coloquei no papel qual seria a pior coisa que poderia acontecer caso não desse certo.
Enfrentando o medo do fracasso
Aqui estão algumas reflexões para ajudar você a enfrentar o medo do fracasso e usá-lo a seu favor:
Experimente: não tenha medo de experimentar novas técnicas, ferramentas ou estilos. Quanto mais você se permite errar, mais você aprende sobre o que funciona para você e o que não funciona;
Estude as histórias de fracasso: nós tendemos a olhar a grama do vizinho sempre com a perspectiva de que tudo dá certo para o outro. Busque histórias de erros. Aprenda com o crescimento do outro. Veja produções antigas de quem você se inspira. Compare-se a como a pessoa começou, não a como ela está hoje;
Melhoria contínua: não se prenda à ideia de perfeição imediata; em vez disso, concentre-se em fazer progressos constantes e significativos.
Eu não desenvolvi autoconfiança para então empreender. Eu fui desenvolvendo enquanto empreendo. Confiar no potencial do seu negócio é construído através de pequenas conquistas. Cada passo importa e merece ser comemorado. Você passa a valorizar cada momento: o primeiro cartão de visitas, o primeiro domínio, o primeiro cliente, o primeiro boleto pago fruto 100% da sua empresa. Essas pequenas vitórias são marcos no caminho.
Claro, como vou reforçar várias vezes ao longo deste livro, não quero romantizar o empreendedorismo. Nem todos os dias são fáceis. Mas há algo muito especial em fazer o que você ama – isso torna as coisas mais leves. Definir metas alcançáveis e trabalhar para atingi-las faz com que cada conquista, por menor que seja, se torne um tijolo na construção da sua confiança e do seu legado.
Mesmo que o projeto não dê certo como esperado, há o mérito em arriscar. A coragem de tirar uma ideia do papel e executá-la é, por si só, uma vitória. Cada tentativa traz aprendizados para o seu crescimento pessoal e profissional. O fracasso não é o fim, mas parte do processo de amadurecimento.
É natural sentir medo ao embarcar em algo novo e desconhecido. O segredo não é eliminar o medo, mas aprender a agir apesar dele. O crescimento ocorre fora da zona de conforto, e cada pequeno passo em direção ao seu objetivo ajuda a reduzir o temor. Como eu sempre digo, vá com medo mesmo.
Quer continuar lendo?
Este foi um trecho de capítulo do livro “Crie. Reinvente. Empreenda.”, de Andressa Siegel — um convite direto e honesto para mulheres que querem criar com mais autonomia, coragem e propósito.

Andressa Siegel é estrategista de negócios e designer com mais de dez anos de experiência na criação, escala e gestão de produtos digitais e serviços em indústrias como e-commerce, educação, saúde, beleza e moda. Pós-graduada em Design Centrado no Usuário, liderou equipes multidisciplinares e atuou como especialista em startups em estágio inicial, scale-ups e consultorias. Já trabalhou para empresas como Olist, Isaac, Rumo Logística e WGSN. É especialista em construir processos e experiências de vendas.
Leia também
Como montar um portfolio para trabalhar com UX Design
Editora Brauer
Como fazer teste de usabilidade: Planejar, executar e analisar testes de usabilidade de forma eficaz
Editora Brauer
Como definir Personas e Proto personas: Humanizando Projetos de UX focados no Usuário
Editora Brauer
Profissionais de UX: Como criar experiências memoráveis e superar expectativas
Daniel Furtado
Desafios comuns para UX designers em grandes corporações
Bruno Duarte